domingo, 27 de julho de 2008


ROMEU E JULIETA
RUTH ROCHA

Há muito tempo, não muito longe daqui, havia um reino muito engraçado. Todas as coisas eram separadas pela cor. Branco, amarelo, azul, vermelho, preto.
O que era branco morava junto com o que era branco. Todas as flores brancas no mesmo canteiro.
As borboletas brancas só visitavam o canteiro branco.
Todas as flores azuis num canteiro separado. E as borboletas azuis só visitavam este canteiro. Não havia misturas...
No canteiro amarelo, morava uma linda família de borboletas amarelas. Tinham uma filhinha chamada Julieta.
Ela era muito engraçadinha. Já sabia voar. De manhã, voava com sua mãe de flor em flor.
Mas quando Julieta queria voar para o canteiro azul, sua mãe dizia:
- Não, Julieta, tal borboleta no seu canteiro!
Julieta ficava triste. Fechava as asas, abaixava as antenas e chorava uma lágrima amarela de borboleta...
No canteiro de miosótis, morava uma família de borboletas azuis. Tinham um filhinho chamado Romeu.
Romeu era muito engraçado. Sabia voar para frente e para trás. Dava cambalhotas no ar. Voava com uma asa só. Borboleteava por todo canto.
O pai sempre falava:
- Romeu, Romeu, nada de passeios nos canteiros de outra cor, é perigoso!
- Ah, papai, as roasa são tão cheirosas...
- Cheiro não é tudo na vida, meu filho. Lugar de borboleta azul é no canteiro azul. Sempre foi assim...
Romeu fechava as asas, abaixava as antenas, perdia a graça e pensava:
- Por que?
Mas Romeu era muito curioso. Queria conhecer todas as cores. Todas as flores. Todos os canteiros.
Um dia, na primavera, seu amiguinho Ventinho falou:
- Vamos dar uma voltinha?
- Onde?
- No canteiro das margaridas. Está lindo...
- Papai não deixa, margarida é amarela, e eu? sou azul. Depois as borboletas amarelas podem não gosta, não é?
- Que bobagem! Eu tenho uma amiguinha chamada Julieta, que é muito boazinha e ela é amarela...Duvido que ela não goste de você. Vamos?
- Ta bom, mas não conta nada pra ninguém.
E eles saíram voando de flor em flor.
Quando chegaram ao canteiro amarelo, Romeu se escondeu no talo de uma margarida, que gostou logo dele. E Ventinho trouxe Julieta para conhecer Romeu. Os dois logo ficaram amigos.
- Que asas lindas!
- Que nada! As suas são mais bonitinhas...
- Como você voa engraçadinho...
E Romeu fez tudo que sabia para Julieta ver.
E os dois deram cambalhotas juntos. Julieta errou, poprque nunca tinha dado cambalhotas.
Romeu deu uma risada azul e Julieta deu uma risadinha amarela...
Os três, voando e borboleteando de flor em flor, entraram, sem perceber, na floresta.
E viram coisas que nunca tinham visto. Plantas estranhas, bichos de todos os tamanhos e um riacho que cantava: Chuá, chuá...
E eles olharam dentro do riacho e gritaram
- Olhe as borboletas...
- Dentro d’agua, molhadas...
Ventintinho riu muito;
- São vocês mesmos. A água é como um espelho!
E os dois fizeram muitas brincadeiras defronte da água – caretas, pulos. E deram muita risada. E Ventinho fazia ondas na água e atrapalhava.
Numa clareira da floresta, uma família fazia piquenique. As crianças cantavam: “Apareceu a margariga,
Olé, olé, olá...
Apareceu a margarida,
Olé, seus cavaleiros...”

Eles gostaram muito e resolveram brincar também. Entraram na roda. O vento mexia no cabelo dos meninos. E as borboletas dançavam. Mas um menino parou e gritou:
- Olha lá! Vamos caçar borboletas para minha coleção?
- Ih...Nossa!
Romeu se assustou, Julieta ficou ainda mais amarela. Ventinho soprou uma poeira para atrapalhar os meninos e berrou:
- Fuja, Romeu! Fuja, Julieta! Depressa!
E os dois voaram...e sumiram dentro da floresta.
No canteiro amarelo, a mãe de Julieta chorava:
- Onde está minha borboletinha?
Nenhuma margarida dizia nada.
No canteiro azul, a mãe de Romeu gritava:
- Romeu, filho meu, onde você se meteu?
E os papais borboleteavam para todos os lados e não achavam nada. Mas também, dos seus canteiros, não arredavam as asas.
Mas lá no fundo da floresta, Romeu e Julieta já estavam cansados, coitados:
- Não adianta, Romeu, nós não sabemos o caminho...
E Ventinho levantava as folhas, procurando o caminho. Estava escuro e não se enxergava nada...Julieta tremia de frio, a floresta estava diferente...
Os passarinhos piavam. Os olhos dos bichos brilhavam no escuro. E dona Coruja falou, com a voz grossa:
- Fiquem aqui junto de mim! Hum, hum, hum! Fiquem aqui até o dia clarear!
E eles ficaram.
Mas olhavam para todos os lados:
- Será que ninguém vem buscar a gente?
- Mas...será?
Mas você não sabe o que aconteceu lá nos canteiros... Dona Margarida falou com a borboleta amarela. Contou que Julieta tinha saído com Romeu e Ventinho.
E a borboleta amarela criou coragem e foi falar com a borboleta azul. As duas se juntaram, chamaram os maridos e foram falar com o senhor Vento e dona Ventania.
E todos Saíram de canteiro em canteiro procurando:
- Romeeeu!!
- Lulieta!!
- Ventinho!...
Do canteiro verde, vieram os vaga-lumes com suas lanterninhas. A noite juntos procuraram.
E quando amanheceu o dia, o céu estava cheio de cores. Romeu e Julieta, encolhidinhos no seu galho, viram chegar uma revoada de pontinhos coloridos. Que beleza...
Julieta arregalou os olhos. E Ventinho fez:
- Fiuuuuuuuuu!
Romeu bateu palmas. E cada mamãe pegou o seu filhinho.
E as outras borboletas, contentes, borboleteavam. Batiam as asas. Falavam.
- Até que enfim...Achamos...
- Achamos...Que bom!
E quando chegou de novo a primavera tudo estava diferente naquele reino. Os canteiros tinham todas as cores misturadas. Margaridas nasciam ao lado dos cravos. Dálias amarelas ao lado dos miosótis. E as rosas brancas, vermelhas, amarelas cresciam juntas, misturadas. E juntas brincavam as borboletas. Todas as borboletinhas brincavam de roda. E cantavam:
!Se todas as borboletas do mundo
Pudessem se dar as mãos,
Fariam uma grande roda,
Uma grande roda em volta do mundo.”

(Retirado do CD “Mil pássaros” Produzido por: Sandra Peres e Paulo Tatit,, narrado pela própria autora da história: Ruth Rocha)